O conceito de educação é bastante amplo, mas pode-se dizer que se trata de prática social realizada com intencionalidade de crescimento humano que culmina com a formação do cidadão. O educador Paulo Freire foi mais além, afirmando que “educação é uma práxis social que, além de imprescindível para a formação do indivíduo, deve se constituir num importante instrumento de transformação da realidade, no sentido de tornar o homem pleno, emancipado, consciente do seu papel de cidadão”. Mas, e a nossa educação? Estaria ela a serviço da inclusão social e da cidadania ou simplesmente reproduzindo velhos conceitos e servindo como instrumento de dominação política e ideológica? Sob esse aspecto considero nossa educação questionável… ainda.
Como ferramenta viabilizadora do exercício da cidadania, as ciências que constituem as dimensões educacionais e pedagógicas devem contemplar diferentes aspectos socioculturais, sob pena de redundar numa educação que apenas reproduz conteúdos há muito cristalizados, que pouco ou nada contribuem para a transformação social. Essa era a preocupação de pedagogos como Vera Caneau que, nos anos 80, já chamava a atenção dos educadores pela necessidade de mudança. Sua ideia não desprezava as concepções tecnicistas e instrumentais, mas incluía as dimensões política e humana como forma de conferir à pedagogia e à educação um compromisso social de todos os envolvidos com o processo de ensino.
Se para educadores como Paulo Freire e José Carlos Libâneo é preciso pensar a educação como formação visando a transformação da sociedade e emancipação do sujeito, a realidade brasileira nos mostra que no modelo e estrutura educacional atuais, é impossível educar, de fato, o ser humano. As grandes disparidades sociais acabam refletidas no universo pedagógico e contribui para a manutenção do “status quo”, conferindo ainda mais à nossa educação o estigma de instrumento de dominação política e econômica do indivíduo. O comprometimento de educadores e pedagogos com o processo de ensino deve se dar através de “tempos” e “conteúdos”. Estes contemplam tudo o que diz respeito à formação humana e são mais amplos e mais consistentes, quanto maior for o compromisso dos envolvidos. O resultado será o estabelecimento de uma pedagogia que considere os processos de ensino e aprendizagem como algo inovador e transformador. A escola pública é – ou pelo menos deveria ser – um ambiente favorável onde professores e alunos podem atuar e colocar em prática os propósitos preconizados por autores que pensam a educação como uma prática social transformadora da realidade, sempre objetivando a inclusão, justiça social e a melhoria da qualidade de vida das populações. Para isso é preciso questionar paradigmas e romper com as ideias há muito arraigadas no seio da sociedade formadora de opinião – a mesma que, inclusive, fechou os olhos para o sucateamento da escola pública.
A erradicação dessa espécie de “apartheid” cultural e racial na estrutura educacional brasileira passa pelo aspecto intercultural em sala de aula e pelo resgate da educação pública. A proposta da interculturalidade na educação é de aproximar as pessoas, respeitando os diferentes valores culturais e, ao mesmo tempo, servir de instrumento que viabilize oportunidades e espaços de inclusão para as minorias. A interculturalidade na pedagogia tem caráter de inclusão, interação e empatia, ou seja, culmina numa pedagogia desprovida de preconceitos que rompe com as ideias tradicionais da educação. As dificuldades de uma abordagem mais humana e inclusiva no ensino surgem em decorrência dos paradigmas tradicionalistas que norteiam o processo educacional, sistematizados sob a perspectiva positivista. “Apartheid” que se acentuou com o famigerado EAD – Ensino à Distância – que escancarou de vez as diferenças socioeconômicas nas quais é mergulhado este país.
A verdadeira educação acontece pelo equilíbrio dos 3 pilares: conhecimento, professor e aluno que devem contribuir para a formação humana dos envolvidos. Sendo a aprendizagem um processo sofisticado que se dá pela construção e acontece pelos erros e tentativas na formação do futuro cidadão, o compromisso do professor se reveste de maior responsabilidade e deve considerar os diferentes níveis de conhecimento prévio em que se encontram seus alunos para que tais objetivos sejam alcançados. Produzir uma pedagogia reflexiva e transformadora deveria ser um compromisso institucional permanente que conferiria à educação seu verdadeiro papel.
Dermival Moreira
É bancário aposentado, com Licenciatura em Geografia na UFPE e é autor de “Identidade e Realidade – artigos e crônicas”.