Ilustração: Deev Elliot

Desculpe o palavrão meio neologizável (ops, outro) mas é que convivi tanto com a tal da procrastinação que meio que peguei me preguiçando nessa coisa de adiar o necessário em prol do antecipar o fútil. Talvez o cronista seja o tipo de escritor que mais se dá bem com esse ato de ficar rodeando o trabalho sem chegar ao centro. Talvez.

Mas trabalho novas pesquisas que informam que não é bem assim. Todos adiam grandes conquistas, e me parece, paradoxalmente, que esse adiamento é o ingrediente básico para abrilhantar a centelha e dar potência para que se chegue de fato…a nada. Ou quem sabe, a algo, e esse algo resulte em alguma coisa.

Veja que o cronista é um ser-em-espera. O cotidiano, o assunto, o sabiá, a primavera são elementos que só são domados nesse olhar meio como quem não quer nada. A crônica é na verdade os buracos do queijo suíço. Dão sustentação, dão legitimidade para que o texto não seja um bloco maciço.

A crônica é o ócio elevado à potência do texto.

Esta crônica tem algumas notas esparsas, pois não sei em que dia terei de terminar a tarefinha que me impus:

a) Comprei um caderninho, vulgo bloco, para anotar todas as luminescências que clareiam a cabeça diante do fato inusitado de que o mundo dá o que tem, mas exige sentido.

b) A cânone cronista foi devassado nas dependências da melhor universidade do mundo, a Rede de Balanço, que é toda de Humanas, pois oscila sem se fixar em nenhuma certeza de chão.

c) Os Nadistas (uma seita moderna) foram inspirados nos Estóicos lá pras bandas gregas do pensamento, e disseminam a mesma filosofia que é um ponto acima dos que procrastinam, visto que assumem de vez que não querem fazer nada – enquanto eu e os citados procrastinateurs fingem que querem dar-se à tarefa, sem, contudo, torná-la concreta.

d) Esta crônica será adiada ad infinitum.