Um cachorro está deitado ao lado de um corpo de um homem, possivelmente seu dono, morto por um bombardeio de tropas russas. Foto: Sergei SUPINSKY / AFP

Desde a queda do Muro de Berlim (1989) e a dissolução da União Soviética (1990), a Rússia viu as forças ocidentais se aproximarem de seu território, até então protegido pela aliança entre os países membros do Pacto de Varsóvia, formado em 1955 em resposta à formação da OTAN seis anos antes.  Integravam essa aliança as 13 Repúblicas da URSS, lideradas pela Rússia, mais 9 países do Leste Europeu. Com a queda do vergonhoso Muro, o fim da Guerra Fria e o fim da URSS, o Pacto de Varsóvia deixou de existir e alguns dos seus membros passaram a integrar a OTAN.

Além de vizinha, a ligação da Rússia com a Ucrânia é quase umbilical e Vladimir Putin, presidente russo, jamais aceitaria qualquer passo da Ucrânia rumo ao Ocidente, principalmente integrar uma aliança militar como a OTAN. Indaga-se: tem a Rússia o direito de invadir e destruir um país alegando suposta intenção deste integrar uma aliança militar, ainda que vista como inimiga? E quanto ao presidente Ucraniano, que ninguém conhecia até o início da Guerra: não perdeu Volodymyr Zelenski a oportunidade de dizer ao mundo que é um homem de paz, renunciando a entrada da Ucrânia na OTAN, enquanto acenava que jamais seria marionete do Ocidente? Acredito eu que a neutralidade seria o que de mais inteligente e racional Zelenski poderia fazer pois, ao tempo em que deixaria Vladimir Putin sem o alegado pretexto para lhe atacar, ainda daria um recado a este de que a Ucrânia também não seria seu fantoche. Mas, ao que parece, a retórica beligerante que a “pré-guerra” ecoa é mais interessante para os projetos de poder dos líderes envolvidos do que uma convergência pacificadora. Passados quase 16 meses de combates com quase meio milhão de mortos, tem-se a prova de que a guerra só rende dividendos aos comandantes até que ela comece.

É verdade também que a paz passa por negociações com os separatistas pró Rússia, armados por Moscou, no leste da Ucrânia e na Crimeia, ocupada pelos Russos desde 2014. Ou seja, a guerra para os envolvidos começou há nove anos, em que soldados, mercenários e outros grupos envolvidos dão a este conflito ares de Oriente Médio nos seus piores dias. Lembremos de que  um avião da Malaysia Airlines, com 298 passageiros, foi derrubado naquele mesmo ano pelos separatistas.  Mais do que nunca, hoje, a Ucrânia tem razões para ir para debaixo das asas da OTAN, como acabou de fazer a Finlândia, vizinha da Rússia, deixando Putin sem argumentos e Zelenski de moral elevada. E, ainda que o presidente Ucraniano passe a ser lembrado como aquele que não teve habilidade para evitar o conflito, Putin entrará para o lixo da História por iniciá-lo e pelo que o mundo espera que responda, por crimes de guerra, inclusive.

A invasão russa na Ucrânia, chamada por Putin de “operação especial”, já custou a vida de mais de 400 mil pessoas após 1 ano e meio de confrontos e bombardeios, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas. Destes, 300 mil são militares de ambos os lados; cerca de 100 mil são civis ucranianos, sendo 2 mil crianças. O número de feridos é ainda maior e chega às centenas de milhares, com mais de 10 mil crianças carregando inevitáveis sequelas.

Acrescente-se a esse terror 20 milhões de pessoas desalojadas, expostas a toda sorte de privações.  Como se não bastasse, mais de 17 mil garotas e garotos ucranianos foram sequestrados pelos russos com a abjeta desculpa de que é para sua proteção, quando na verdade o objetivo é torná-los russos. A Organização Humanitária “Save Ukraine”, que está fazendo um trabalho de mapeamento e busca destes meninos, já conseguiu resgatar mais de 4 mil deles e devolver às suas famílias. Um pesadelo evitável, que somente a insensatez e a brutalidade explicam.

Finalizemos avaliando a justificativa de Putin para isso tudo, qual seja, o alinhamento crescente da Ucrânia ao Ocidente. Todavia, sabemos também que a estupidez de Vladimir Putin é ancorada no fato da Rússia possuir vastos arsenais nucleares que o próprio Putin não descarta lançar mão em caso de ser atacado diretamente por qualquer país ocidental. Ora, se o poder nuclear russo dá àquele país essa segurança para promover tal carnificina, sem temer ser atacado por qualquer dos países ocidentais, por que então suas bombas atômicas não lhe asseguram a paz e mantém seu país a salvo, ainda que a Ucrânia integre a OTAN?  Vocês acham que, se o Ocidente que até agora não atacou a Rússia, a atacaria em tempos de paz? Na verdade, o que Putin quer mesmo é derrubar o governo de Volodymyr Zelesnki e colocar no comando da Ucrânia um capacho seu, um governo fantoche, que leia pela sua cartilha, como é a Bielorrússia. Putin é um saudosista da falida União Soviética que anexou 14 repúblicas no Leste Europeu para garantir no poder o ditador Josef Stalin – e todos aqueles que o sucederam – por 70 anos. Enquanto isso, o Presidente Lula não se define quanto a quem apoiar e engendra um discurso dúbio, que nivela agressor e agredido, conseguindo desagradar a todos.