Por volta de 4 mil anos atrás, no período máximo de ocupação do planeta pelas populações – mas bem anterior à colonização branca dos “novos mundos” – calcula-se que eram falados entre 9 e 10 mil idiomas/dialetos. Desde então muitas línguas foram extintas e hoje resta vcm pouco mais da metade daquelas faladas na antiguidade, sendo que 20% destas jamais foram utilizadas na forma escrita.
Muitas são as causas para a extinção dos idiomas, mas sabe-se que o fenômeno está associado ao desaparecimento dos povos ou etnias que os falava; ou, à absorção, por estes, da cultura e idioma de povos invasores. Pode acontecer por imposição ou absorção, quando determinados grupos são dominados por outros que impõem seus costumes e sua cultura. A interação pacífica de um povo com outro, econômica e culturalmente mais avançado, também é uma das causas mais comuns. Hoje, no planeta, um percentual expressivo de idiomas conta com poucos falantes e estão ameaçados de desaparecer. Outro dado é que 90% da população mundial responde por apenas 200 idiomas.
A extinção dos idiomas se acelerou após a Revolução Industrial e se agravou com a globalização, quando as línguas das potências hegemônicas, a exemplo do inglês, francês e espanhol, se firmaram no comércio internacional e entre os nativos das colônias. Qualquer semelhança com o que aconteceu nas Américas não é mera coincidência. A colonização europeia é um exemplo clássico do que houve em muitas áreas do globo, com perdas culturais irreparáveis para os povos nativos e, porque não dizer, para a humanidade. A perda do idioma talvez seja o que há de mais representativo de prejuízo cultural quando falamos de invasões e dominação de uma população sobre outra.
Passado o grande impacto de exploração e colonização europeia nas novas terras, houve uma aparente estabilização dessa dinâmica nefasta da imposição cultural – ao menos na forma que se verificou alguns séculos atrás. Ainda assim, muitos idiomas e dialetos falados pelas populações minoritárias continuam a desaparecer numa média de 9 ou 10 ao ano – um idioma é considerado extinto quando lhe resta menos de dois falantes nativos vivos.
Esse processo tem sido inversamente proporcional ao aumento da população: No ano 1 d. C. estima-se que a população mundial era cerca de 200 milhões de pessoas (menor do que a população do Brasil hoje) e havia mais ou menos 8.500 idiomas ativos; 1.000 anos depois a população mundial era cerca de 300 milhões e os idiomas falados em torno de 8.000. Na época das Grandes Navegações, 500 anos atrás, a população da Terra era de aproximadamente 500 milhões de pessoas e mais de 7.500 idiomas ainda eram falados no mundo; há 100 anos, havia 1,7 bilhões de pessoas na Terra e quase 1.500 idiomas já haviam sido extintos. No ano 2.000 havia 6,3 bilhões de pessoas no mundo e os idiomas extintos até aí são calculados em mais de 2.000. Hoje somos 8 bilhões de pessoas no mundo que falam 6.500 idiomas, sendo que 4 bilhões respondem por apenas 20 idiomas. No Brasil, 80% das línguas nativas faladas já foram extintas. Embora a nossa população indígena tenha aumentado de 200 mil para quase 1 milhão de indivíduos nos últimos 50 anos, a grande perda da linguagem nativa falada já havia ocorrido nos 500 anos anteriores, quando os indígenas aqui somavam 5 milhões.
David Crystal, linguista irlandês, afirma que a internet pode evitar o destino lamentável que parecia reservado a cerca de metade dos 6,5 mil idiomas ainda falados em todo o mundo. Segundo ele a rede mundial oferece aos idiomas ameaçados uma chance de conquistar voz pública da forma que não teria sido possível no passado. Isso porque os idiomas em risco estão aparecendo em blogs, serviços de mensagens, chats, no youtube e em páginas de relacionamentos. Essa presença no mundo virtual atrai o apoio dos jovens que os falam e, para que uma língua sobreviva, é preciso que seja atraente aos jovens. “Se uma linguagem conquista espaço na rede, é muito mais provável que os jovens considerem que ela é interessante”. Há 100 idiomas no mundo com menos de 3 falantes e cerca de 2.000 línguas jamais foram registradas na forma escrita. Se esses idiomas morrerem, eles terão ido para sempre. Haverá uma grande perda intelectual para a humanidade, conclui Crystal.
Eu, por minha vez, faço uma modesta observação à fala de Crystal: ainda que a internet, dominada pelo idioma inglês, ironicamente, possa evitar a perda total dos registros dos idiomas minoritários restantes, arrisco dizer que uma língua só permanece viva, de fato, se for falada por uma comunidade; que tenha linguagem escrita; e, que represente os valores culturais desta. A internet salvará apenas seus registros, mas os valores intrínsecos à cultura e ao idioma daquela população estarão perdidos.
Idiomas mais falados no Mundo, em ordem: Inglês; Chinês; Espanhol; Hindi; Árabe; Francês; Bengali; Russo; Português; Indonésio e Japonês. A manterem-se o status econômico e populacional atual das nações, teoricamente estas seriam as 12 primeiras línguas mais faladas das cerca de 80 que restarão na Terra daqui 1.000 anos.
Dermival Moreira
É bancário aposentado, com Licenciatura em Geografia na UFPE e é autor de “Identidade e Realidade – artigos e crônicas”.