Outro dia, vi uma frase no Instagram que dizia, mais ou menos, assim: Admiro a mulher guerreira que não se dá por vencida, sorri e balancei a cabeça, pensando como um dia eu, ignorante, também admirei essa mulher. Hoje, aos 37 anos, vejo muitas réplicas da Mulher Maravilha, seja no trabalho, na fila do supermercado, na academia, nas feiras literárias, no espelho…a conversa é a mesma, a exaustão. A “guerreira” faz tudo por todos, “é desdobrável”, como diz Adélia Prado, o que lhe custa, na maioria das vezes, o banho mal tomado, a comida fria, a ansiedade, a solidão. Machucada, julgada e presa numa caixinha de perfeição; ela faz tudo, pode tudo, é capaz, pois a utilidade faz a guerreira.
A verdade é que as mulheres carregam consigo um fardo pesado, moldado pelas expectativas sociais. São cobradas a ter um corpo perfeito, a conciliar a maternidade com a carreira, a serem mães exemplares e profissionais competentes, e a estarem sempre prontas para tudo. Essas demandas se entrelaçam em um emaranhado de pressões que muitas vezes sufocam a liberdade e a individualidade feminina. A sociedade impõe padrões inatingíveis, esquecendo-se de que cada mulher é única em sua jornada.
Admiro a força das mulheres que se permitem cansar. No turbilhão do dia a dia, elas não são super-heroínas incansáveis, mas seres humanos reais. Mulheres que se desfazem do fardo de serem perfeitas e abraçam a beleza do cansaço. Elas desafiam a ideia de que a realização vem apenas da constante atividade. Em vez disso, encontram valor na pausa, no autocuidado e na aceitação da própria vulnerabilidade. Nessa jornada, descobrem que o verdadeiro poder está em se permitir ser completa, com todos os altos e baixos.
Não. Eu ainda não sou essa mulher que admiro, mas acredito ter dado o primeiro passo ao enxergá-la, ao vê-la como a verdadeira guerreira, que reconhece seu tempo, luta pelo seu espaço, sabe dizer não, valoriza o descansar como um processo criativo, que chora na frente dos filhos, que pede ajuda, que prioriza a sua felicidade e que se solidariza com a mulher maravilha, mas que não se permite salvar o mundo sozinha.
Nós, mulheres, precisamos reconhecer a diversidade de escolhas e trajetórias, nos libertando do peso dessas expectativas irrealistas. Cada mulher é única, com sonhos, desejos e ambições que merecem ser respeitados e valorizados. Precisamos nos permitir seguir nossos próprios caminhos, independentemente das normas sociais ou estereótipos de gênero, para promover a igualdade e a justiça em nossa sociedade.
Quando apoiamos umas às outras, criamos um ambiente de colaboração e empoderamento, no qual todas têm a oportunidade de prosperar, pois a sororidade também é fundamental para combater estereótipos e expectativas injustas impostas às mulheres, promovendo uma cultura de aceitação, celebração da diversidade, e o direito de não fazer nada. Além disso, ao nos unirmos em solidariedade, criamos mudanças significativas na sociedade e construímos um futuro mais justo e igualitário para todas.
Ao reconhecer e celebrar a diversidade de escolhas e trajetórias femininas, estamos abrindo espaço para que cada mulher se sinta livre para ser quem ela é, sem restrições ou julgamentos. Isso significa apoiar mulheres em suas carreiras profissionais, em suas decisões familiares, em suas expressões artísticas, em seu momento de exaustão, quando dizem “Não”, e em todas as áreas da vida em que desejam se destacar. A admiração verdadeira, é quando se admira também as fragilidades. Eu admiro muito as mulheres que cansam.
Natural de João Pessoa-Paraíba. É filha de Adeci Beserra Venâncio e mãe de Ana Carolina Venâncio. Mestre em Letras e professora de Língua Portuguesa nos Estados da Paraíba e Pernambuco. É membro da Academia de Cordel do Vale do Paraíba (ACVPB), do Coletivo Marias da Poesia, e do grupo Mulherio das Letras Paraíba. Participou de várias coletâneas e antologias poéticas. É autora do livro Lonjuras (2019) e dos folhetos de cordel: Lonjuras (2019/2023); Um conto de era uma vez (2020); Carta ao mestre Paulo freire (2021); Nenhuma mulher merece ter seu direito negado, cordel coletivo (2022); Mulherio das Letras (2022); Manoel José de Lima – mané Caixa d’água (2023); Retalhos diversos (2023); Corpo Violado (2023); Morena do sol e o Cangaceiro (2023).
MULHERIO DAS LETRAS
Coletivo literário feminista que reúne escritoras, editoras, ilustradoras, pesquisadoras e livreiras, entre outras mulheres ligadas à cadeia criativa e produtiva do livro, no Brasil e no exterior, a fim de dar visibilidade, questionar e ampliar a participação de mulheres no cenário literário.