Governo entrega Prestação de Contas Anuais do exercício 2022 Fatima Bezerra Foto.Magnus Nascimento Repórter Bruno Vital

O Governo do Estado teve um superávit nas contas de R$ 166,68 milhões em 2022, segundo a prestação de contas apresentada na manhã de segunda-feira (3), pela governadora Fátima Bezerra (PT). Apesar do saldo positivo, o Estado está funcionando no limite de sua capacidade, segundo a Secretaria de Finanças e Planejamento.

O resultado superavitário também não foi suficiente para evitar que o Governo aplicasse um reajuste de dois pontos percentuais na alíquota do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) – de 18% para 20% – desde o último sábado (1º).

O superávit apresentado pelo governo diz respeito ao saldo entre arrecadação (R$ 17.772.051,39) e despesas (R$ 17.689.184,55). A governadora esteve na cerimônia de divulgação da prestação de contas, mas não deu detalhes a respeito da relação entre o resultado superavitário e a necessidade de aumento de impostos. Ela comemorou o índice e disse que o resultado não foi melhor “por causa de medidas eleitoreiras” em referência à desoneração fiscal implementada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro para combustíveis, energia e comunicações em meados de 2022. Nos cálculos do Governo, o RN teve uma queda de R$ 440 milhões entre agosto e dezembro após essas mudanças na legislação.
 “O superávit deste ano só não será melhor, dado o ataque especulativo que o pacto federativo enfrentou diante da medida irresponsável, eleitoreira e oportunista do governo anterior com a aprovação da lei que fez uma mudança no ICMS. Algo impensável. Só eu e minha equipe sabemos o quanto foi desafiador”, afirmou.
Segundo o Governo do RN, em 2022, cerca de R$ 2,5 bilhões foram aplicados na Educação; R$ 2,2 bilhões na Saúde; e R$ 1,6 bilhão na Segurança Pública. Esse é o terceiro ano consecutivo em que o Estado fecha as contas no verde. No ano passado, o saldo positivo foi de R$ 348 milhões e de R$ 177 milhões.
Das despesas do ano passado, a maior parte ficou com o pagamento de pessoal. O Estado superou o limite de 49% – estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) – e atingiu 53,37% da receita corrente líquida. Mesmo assim, a gestão de Fátima Bezerra enfrenta greves. A primeira é na educação, pelo pagamento do piso nacional dos professores e do retroativo. A categoria diz que o governo deve R$ 360 milhões referente ao pagamento do piso de 2022, faltando também a implementação deste ano.
Aldemir Freire diz que, caso o Governo atendesse a demanda dos professores, em greve há um mês, na íntegra, a despesa representaria cerca de R$ 580 milhões ou 96% do aumento da receita. “Nós não podemos, sob pena de penalizar a assistência a saúde, segurança e o próprio custeio da educação, pegar R$ 580 milhões de R$ 600 milhões e aplicar todo no piso. Esse é um problema que não é apenas dos professores, o aumento de receita que nós vamos ter, nós precisamos dividir com professores, mas também aumentar gastos com saúde, educação, estradas”, exemplificou Freire.
A outra greve está prestes a eclodir na saúde estadual a partir do próximo dia 11.  Os trabalhadores pedem revisão da Lei de produtividade, pagamento das perdas salariais para ativos e aposentados, cumprimento da data-base, pagamentos dos plantões eventuais dentro do mês trabalhado, implementação e pagamento do Piso Salarial da Enfermagem e do Piso Salarial dos Técnicos em Radiologia.
Contudo, o Governo não fala em corte de gastos. Para 2023, espera um incremento de R$ 600 milhões na receita, valor que o secretário de Planejamento considera insuficiente para os compromissos do ano. Segundo ele, não há projeto de corte de gastos porque o Estado “não tem muito mais o que cortar”. “O Estado já funciona praticamente no limite de sua capacidade”, comenta Aldemir Freire.
ICMS maior: prejuízos para quem ganha menos
 
Com o aumento da alíquota de 18% para 20% do Imposto sobre Comércio, Mercadoria e Serviços (ICMS) no Rio Grande do Norte, lideranças de entidades sindicais representantes de trabalhadores no Rio Grande do Norte apontam que o trabalhador que recebe menos será o mais penalizado. O reajuste passou a vigorar no último sábado (1º) e vale até o dia 31 de dezembro. Os sindicalistas defendem que o Governo do RN deveria analisar outras formas de recompor as receitas, como taxar grandes fortunas, por exemplo.
As lideranças repercutiram com a TRIBUNA DO NORTE o estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos do Rio Grande do Norte (Dieese-RN), que apontou que o aumento absorverá aproximadamente 45.343 salários mínimos por mês e que os potiguares terão sua renda tributada em mais R$ 198,91 em 2023, representando 15% do salário mínimo de R$ 1.302,00 em vigor.
A presidente do Sindicato dos Servidores da Administração Direta (Sinsp-RN), Janeayre Souto, destaca que o aumento tributário reduz o poder de compra de trabalhadores e dos servidores públicos estaduais. “É desfavorável para a população porque aumenta o preço dos produtos e reduz o poder de compra dos trabalhadores, inclusive dos servidores, que não têm reajuste salarial e estão com seus salários defasados. Então, enquanto o Estado aumenta impostos, seus recursos, o servidor não acompanha esse crescimento”, aponta.
Ainda segundo Janeayre Souto, o Sinsp não enxerga “motivos” para o reajuste do imposto nesse momento, “pois referente aos dados econômicos do Estado, no 1º bimestre de 2023 a arrecadação dos tributos estaduais no RN cresceu 4,23%, enquanto o Nordeste caiu – 9,42%.  O maior estado do Nordeste, a Bahia, teve queda de -5,28%, por exemplo, segundo dados do CONFAZ”.
A coordenadora do Sindicato dos Servidores em Saúde Pública do RN (Sindsaúde), Rosália Fernandes, tem uma percepção semelhante e sugere alternativas. “Não serão os mais ricos que estarão pagando ou sofrendo penalidades com o pagamento desses impostos. Será a classe trabalhadora, que ganha um salário que mal dá para se manter. No ano passado, tínhamos 1,5 milhão de pessoas na situação de pobreza ou extrema pobreza. Esse aumento da alíquota vai melhorar a situação dessas pessoas, que não têm o que comer?”, questiona. “Porque o governo não estuda um aumento nas grandes fortunas? Nos carros de alto padrão? Embarcações, aeronaves, grandes empresas? Isso é que deveria ter”, opina a sindicalista.
Essa é a mesma linha de raciocínio da coordenadora geral do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do RN (Sinte-RN), Fátima Cardoso. “Isso vai reverberar na mesa do trabalhador que tem menor salário. Sabemos que o Governo tem apresentado suas dificuldades, tem buscado alternativas que não são consideradas as melhores. A gente luta pela taxação às grandes fortunas que é para quem recebe menos imposto de renda, por exemplo, pagar quem hoje é penalizado por essas alternativas do governo”, analisa.
Na última sexta-feira (31), o secretário de Planejamento e Finanças do Rio Grande do Norte, Aldemir Freire, disse que a aplicação das novas alíquotas é necessária em razão da queda de arrecadação do Estado em 2022, da ordem de R$ 440 milhões.  Ele argumentou que a cobrança de dívida ativa não é suficiente para repor as perdas. “Muito do que está lá são títulos podres. São dívidas de 20, 30 anos, que é incapaz de recuperar. Boa parte disso aí, por exemplo, os devedores nem têm patrimônio para pagar. Temos um esforço de cobrança, mas não é essa cobrança que vai resolver nosso problema. O que vai resolver é arrecadação”, disse ele.
Semestre deficitário justificaria aumento do ICMS
De acordo com o secretário de Estado da Tributação, Carlos Eduardo Xavier, o cenário de superávit compreende todo o ano, mas o quadro do segundo semestre foi de déficit, o que explica a “necessidade” pelo aumento do ICMS. “A realidade do ano passado se divide em duas: uma antes e outra depois da LC 194/22 [Legislação que reduziu o ICMS no ano passado]. Temos que trabalhar para esse ano com a realidade pós-aprovação da LC 194”, disse.
Segundo ele, o resultado nominal foi de R$ 740 milhões no primeiro semestre, mas, no segundo semestre, ficou R$ 574 milhões negativos.
O secretário de Planejamento, Aldemir Freire, diz que o Governo está “cumprindo a lei” e que uma possível suspensão do aumento do ICMS depende da homologação, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), de um acordo entre Estados e União para compensação de perdas na arrecadação no ICMS. A expectativa é de que o Rio Grande do Norte seja beneficiado com R$ 277 milhões.
“Foi feito um acordo, mas isso ainda não está homologado. Portanto, não havia discussão, no momento, se a lei entraria ou não em validade. Existe uma lei e as condições para essa não estar valendo não estão postas. Não existe nenhum acordo assinado ainda pelos governadores, homologado pelo supremo e com a assinatura da União”, destacou Aldemir Freire. “No momento em que as condições de suspensão da lei estiverem postas, a governadora vai chamar a Assembleia Legislativa para fazer uma discussão”, completou.