Apesar de quase duplicar sua população no país em pouco mais de uma década, segundo o Censo Demográfico divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 3 de abril – de 896 mil para 1.65 milhão de pessoas, os indígenas são ignorados pela base curricular brasileira.
A avaliação é do mestre e doutorando no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade de São Paulo, professor de sociologia e Guarani Ñandeva, Emerson Souza – único professor efetivo na escola em que leciona, na Cidade Tiradentes, periferia de São Paulo.
Para ele, até mesmo políticas públicas como a Lei 11.645/2008, que trata do ensino de História e Cuultura Afro-Brasileira e Indígena, têm sido negligenciadas.“Precisamos descolonizar os currículos”, defende. “O modelo de ensino que adotamos ainda prioriza a matriz europeia, excluindo demais matrizes. Isso se reflete nos espaços públicos. Basta ver quantos indígenas temos na diretoria de ensino do estado de São Paulo”, acrescenta.
O QUE DIZ A LEI- Em relação à educação, a Constituição Federal diz que o ensino fundamental deve ser ministrado em língua portuguesa, mas é assegurada às comunidades indígenas também a utilização das línguas maternas e processos próprios de aprendizagem.
De acordo com o Censo Escolar de 2022, das 178,3 mil escolas de ensino básico, 1,9% (3.541) estão localizadas em terra indígena; e 2% (3.597) oferecem educação indígena por meio das redes de ensino. Voltadas ao ensino fundamental, são 1,95% (3.484 escolas) em territórios dos povos originários. Quando o assunto é o recorte cor/raça, dentre as 72,5% das matrículas de alunos (em torno de 34 milhões) que trazem essa informação, 1% se declararam indígenas.
Para Souza, as dificuldades impostas à profissão de professor/a impactam ainda mais as populações que estão à margem da sociedade e enfrentam condições mais difíceis de progressão na pirâmide social. Assim, ressalta ele, a extinção das políticas salariais e de evolução funcional dos educadores na rede pública, aliada à falta de uma base curricular capaz de permitir que a cultura indígena seja valorizada e à falta de apoio ao magistério afugentam os povos indígenas da sala de aula.
“A política de aumento por meio de subsídios rompe com a luta por melhorias salariais e a garantia de direitos. Perdemos, nos últimos anos, inúmeras conquistas por meio da política liberal que praticamente acabou com a valorização do salário base. Quando isso vem acompanhado do apontamento da diversidade indígena como algo inferior, temos um ambiente completamente desfavorável a nós”, explica.