Em 1982, num comício na “Praça Camilo de Holanda”, em Cajazeiras, o então candidato a governador, Antônio Mariz, iniciou seu discurso mais ou menos assim: “Cajazeiras, cidade irmã da minha terra natal, Sousa (…) duas cidades do sertão paraibano que crescem com suas economias baseadas no comércio e na agropecuária (…) portanto, a História de Cajazeiras é a mesma de Sousa…”. Naquele momento achei a referência interessante, até porque Cajazeiras estava sendo comparada com a então terceira cidade da Paraíba em população, de acordo com o Censo IBGE (1980). Mas investigando melhor desde então, hoje eu não concordaria tanto com as palavras do saudoso governador. Se analisarmos bem, vemos que a história de Cajazeiras é diferente da história de Sousa, ainda mais quando se considera que as duas cidades estão situadas apenas 40 km de distância uma da outra; essa proximidade realça ainda mais as diferenças.

Diferenças que começam pela Geografia e se estendem até à História. Mais antiga do que Cajazeiras, Sousa foi um dos primeiros núcleos de povoamento no sertão paraibano. Está localizada em terrenos sedimentares e argilosos, banhada pelos rios Piranhas e rio do Peixe. Seus solos, em sua maioria, são férteis, profundos e pouco acidentados, o que facilita a pecuária, pelas pastagens em planícies, e a agricultura, pela aplicação da mecanização em boa parte de suas várzeas. A abundância de água no seu subsolo é outra característica importante numa região semiárida. Essas condições conferem ao município de Sousa bons indicadores agropecuários com reflexo nas atividades urbanas ligadas ao meio agropastoril, a exemplo do comércio de implementos e insumos agrícolas, veterinários e indústria de laticínios. O município de Sousa é também o maior produtor de arroz da Paraíba e tem a maior bacia leiteria deste estado. Tem ainda em seu território extensas plantações de coco e banana nos núcleos agrícolas do Distrito de São Gonçalo, considerado o “oásis do sertão paraibano”. As atividades do setor secundário também ali se desenvolveram a exemplo de algumas indústrias de doces e massas alimentícias. Foi sob essas condições agrícolas, naturalmente favoráveis, que a terra de Bento Freire nasceu e se desenvolveu, sendo por muito tempo o comércio e os demais setores uma consequência das atividades rurais.

A cidade de Cajazeiras, por sua vez, nasceu em torno de um colégio fundado pelo Padre Rolim. Como cidade filha de Sousa, de quem já foi distrito, herdou uma área de quase 600 km², de terrenos em sua maioria acidentados e rasos. A agropecuária nunca foi seu ponto forte e na maior parte do seu município as condições não permitiram o desenvolvimento da agricultura irrigada. Com o fim da cultura do algodão – seu maior produto agrícola – no início dos anos oitenta, nossa cidade enfrenta grande crise neste setor, visto que o meio natural não oferecia alternativas ao cultivo de outras culturas na mesma escala. Sem o impulso agropecuário, a cidade se desenvolveu ancorada num comércio varejista bem diversificado e no setor de serviços, com destaque para a educação.

Como que procurando ser coerente com sua história, a cidade assumiu de vez sua vocação educacional. Cresceram os investimentos na educação, inclusive privados. Nesse aspecto, é importante destacar o papel da Diocese local que por muito tempo esteve na vanguarda do ensino em nossa cidade: foi assim alfabetizando os sertanejos; mais tarde promovendo o ensino secundarista; depois, no ensino superior, com a fundação da FAFIC – por muito tempo a única faculdade de formação de professores do sertão paraibano, – instituição que possibilitou a realização do sonho da graduação para muitos sertanejos da Paraíba e de estados vizinhos. Praticamente vizinha a dois estados nordestinos, a cidade passou a ser sinônimo de referência e esperança para muitos forasteiros na continuação dos seus estudos. A atração de pessoas de fora dinamizou outros setores da economia, a exemplo do imobiliário e do comércio varejista. Cajazeiras, que polariza a microrregião de mesmo nome, nos últimos anos foi beneficiada com a expansão e interiorização do ensino superior em âmbito nacional, e novos cursos foram absorvidos pelo Campus local da UFCG, assim como a instalação de novas instituições de ensino superior privado. A possibilidade da formação superior em diversas áreas passou a ser realidade para seus filhos e jovens de outras praças. Esse fato consolidou de vez a Terra do Padre Rolim como o terceiro polo educacional mais importantes da Paraíba, corroborando e fazendo valer o título de “cidade que ensina”.

Hoje, é visível a boa fase econômica que vive as duas mais importantes cidades da região do Alto Piranhas. A construção civil é um indicador cuja leitura pode ser feita por todos. As diferenças econômica e vocacional verificadas nas duas cidades se mostraram bastante salutar a ambas. Ao tempo que suas atividades se complementam, diminuem também os efeitos da concorrência mútua, pois onde a economia de uma se mostra menos dinâmica, a outra complementa e vice-versa, e as duas ganham. Como dizem alguns economistas e políticos, “é melhor ter um vizinho ‘rico’ com quem negociar, do que um com o qual não se pode nem conversar”. Que nossa rivalidade, até certo ponto também salutar, se restrinja à paixão pelo futebol e ao bairrismo construtivo, jamais apelando para meios rasteiros que ponham em dúvida o que de melhor ambas cidades se propõem hoje a fazer: educar.