Data marcada e um frio na barriga: o lançamento do livro “Na Embolada do Coco”, que vai acontecer na próxima sexta-feira (30), às 20h, na Usina Energisa, culmina um projeto que nasceu em 2019 e que teve tantos processos que é quase impossível detalhar. Da ideia, passando pelo projeto aprovado, à captação de recursos, à equipe, à pesquisa, às entrevistas, à formulação editorial, realizar esta obra foi de uma intensidade difícil de explicar.
Do Conde a Cabedelo, da Baía da Traição a Pilar, de João Pessoa a Jacaraú, passando por Santa Rita, pedimos licença para adentrar os terreiros das mestras Ana do Coco, Cícera, Cida, Edite, Lindalva, Odete de Pilar, Penha, Senhorinha, Têca, Vó Mera e Zefinha. E fomos ali com uma missão: protagonizar estas mulheres, patrimônios culturais da Paraíba e do Brasil.
“Na Embolada do Coco” é uma obra que conta a história de um Nordeste dos engenhos, de luta pela terra, de lideranças, de reconhecimento quilombola, de luta contra o racismo diário de cada dia, de desigualdade social e da força das mulheres que se afirmaram essenciais pela preservação dos seus legados culturais.
O diferencial deste livro é que não somos só nós que contamos essa história. Não ouvimos as mestras e reformulamos suas palavras para caberem no coloquialismo. Elas são mestras, então suas palavras estão expressas como foram exatamente faladas, sem a ousadia arrogante da formatação de texto. Como é que poderíamos cometer a imprudência de corrigir uma mestra?
O tema, que era o coco de roda, logo se transformou numa lição de História dada por quem estava lá, vivendo na pele, épocas e momentos que nós, público, conhecemos muito pouco. E conhecemos quase nada porque a memória brasileira não está construída em bibliotecas e acervos videográficos, porque ouvimos pouquíssimo quem está aqui e realmente viveu, porque preferimos romantizar ficções e outros protagonismos de quem está somente chegando.
Sentar, por horas, e ouvir onze mestras falando do passado, das tradições, de seus pais, de suas preocupações, de desabafos, é algo que levaremos para a vida. Choramos em diversos momentos. De emoção, de dor pela dor alheia, de alegria pelas palavras fortes. E rimos muito também, porque a generosidade e sorrisos destas mulheres guerreiras inundou nossos corações. Foram muitos sentires, muitos pensares, muitos regressos a casa de longos pensamentos e reflexões.
E no fim de tudo isto, uma felicidade extrema em sabermos que estamos entregando um livro belíssimo, com uma qualidade gráfica de excelência, com ensaios fotográficos perfeitos e com textos impecáveis. Estamos, também, entregando a versão audiobook para garantirmos que as nossas mestras e muitas outras pessoas possam ter plena acessibilidade ao que está ali escorrido nas páginas do livro, com as gravações delas, pela voz delas. E ainda a versão ebook, para que o livro voe pelo mundo! 200 exemplares serão oferecidos à bibliotecas da Paraíba, 10 irão para a Biblioteca Nacional e cada mestra irá receber 35 exemplares para o seu acervo pessoal.
Em nota pessoal só tenho a agradecer a estas mestras e a toda a equipe que compreendeu a missão e o que eu queria, realmente, fazer. Dizer que este projeto me deu uma certeza plena da urgência de cuidarmos da memória coletiva e de preservarmos o nosso patrimônio cultural. E desabafar: bem cá dentro há uma portuguesa extremamente envergonhada do passado colonialista, mas que, do seu jeito, está tentando fazer uma pequena reparação histórica.
Salve mestras! Viva o legado de vocês!
Dina Faria
Diretora de produção e sócia-administradora da Atua Comunicação Criativa. Luso-paraibana por opção, desenvolve e realiza projetos culturais em vários estados do Brasil nos mais diferentes segmentos artísticos.