Eis a história do confeiteiro que se apaixonou pela mulher-macaca.

João tinha a cidade em seu nome, mas era Pedro em vez de Pessoa. Conhecia todas as ruas do bairro da Torre, Jaguaribe, Expedicionários, Treze de Maio, Ipês e Mandacaru, além do centro da cidade, de onde partia desde menino com o carrinho de doces junto a seu pai, gritando: cocaaaada, queeebra-queixo, beeeem-casado.

Ano após ano, na Festa das Neves, vendiam maçãs-do-amor em frente ao trailer da Monga. Assim cresceu João Pedro, fascinado com a transformação da bela dançarina em primata feroz – em nome de Zé do Caixão, sob o tridente de Satanás. O menino Pedrinho entrava de graça nas sessões em troca da fruta banhada no caldo da groselha, enfeitada por granulados coloridos.

A Monga do ano se chamava Maria Alice e era sobrinha do dono do trailer. O seu primo a vigiava da bilheteria, enxotando os rapazes que se amontoavam para conhecer a gostosa de lingerie vermelha que de repente virava bicho e os atacava de quinze em quinze minutos enquanto o locutor repetia: calma, Monga, o público é seu amigo!

João Pedro, que não era besta nem nada, levava duas maçãs-do-amor para o bilheteiro no final das sessões. Esta é para a sua prima, dizia como quem não quer nada, e admirava de longe Maria Alice se lambuzar até ficar com a língua tingida de vermelho, notando ser correspondido.Na véspera do aniversário da cidade, quatro de agosto de dois mil e vinte e quatro, a Monga e seu primo bilheteiro foram liberados mais cedo por conta de uma pane no equipamento de som. Convidaram João Pedro para fazer um lanche, retribuindo as duas dúzias de maçãs-do-amor que haviam ganho até então. O primo foi logo atrás da moça do espetinho, com quem flertava desde o início da temporada.

A sós com Maria Alice, as luzes da Lagoa se acenderam no peito de João Pedro. Contemplaram a festa do alto da roda-gigante. Comeram pastéis e cachorros-quentes.Visitaram a Casa do Terror, onde a Monga se protegeu do monstro da motosserra nos braços do confeiteiro. Agarradinhos, cantaram os sucessos do show de Roberta Miranda.

À meia-noite, atravessaram a multidão às pressas. Os pelos começavam a tomar o corpo da moça.

Ana Lia Almeida