Na antiguidade, a literatura era utilizada como papel importante para a formação e o exercício da cidadania. Mas ao longo dos anos, infelizmente, foi marginalizada em sala de aula, sendo o poder de suas palavras subestimado pelos desentendidos.

Quando crianças, jovens ou adultos, experimentamos por meio da arte o que a vida não proporciona e, lendo textos cada vez mais complexos, somos capazes de nos tornarmos mais inteligentes, pois a literatura nos obriga a pensar. Isso porque ela trabalha com os nossos processos imaginativos, fazendo com que saiamos da zona de conforto mental para imaginar personagens, cenários, fazer inferências e, lendo uma obra de difícil interpretação, compreender com mais facilidade outros textos não-literários, além de muitas esferas da nossa própria vida. Nesse sentido, se a literatura faz pensar, ela é ponte para o exercício da cidadania, pois não queremos jovens robôs e sim seres autônomos, protagonistas.

Isso corrobora com o que diz o crítico literário brasileiro Antonio Candido, haja vista a arte da palavra, segundo ele, andar junto com os direitos humanos, já que se pode focalizar e fazer confrontar no ato de leitura situações de restrição ou negação de direitos.

Fonte: Blog do Labemus.

Segundo Regina Zilberman, doutora em romanística pela Universidade de Heidelberg, as Teorias Literárias da metade do séc. XX interferiram diretamente na didática do ensino. E ensinar literatura hoje é complexo porque na escola, principalmente nas do setor público, essa arte é marginalizada, realidade que deveria ter olhar mais atento do poder público, afinal, ler e compreender uma arte literária é se abrir para o empoderamento. Por isso, cabe refletir: como formar um jovem protagonista e autônomo, se a sociedade atual nos leva a um caminho muito mais propício à reprodução de ideias e comodismos mentais? O Chat GPT que o diga. E a literatura, comparada a outras artes, é a única capaz de exigir ainda mais do sujeito em seus processos imaginativos, como menciona a tese de pós-doutorado da Professora Doutora em Teoria Literária Carmen Sevilla (UFPB, 2017), em que se percebe o poder de transformação da estética da palavra.

Desse modo, investir em maneiras de fazer os estudantes pensarem para além da caixinha é de suma importância, pois o contato com a cultura se torna necessário ao ato de ser cidadão. E entender um texto de literatura que não é simples, daqueles que nos obrigam a movimentar o imaginário, ou algum que retrate por meio da linguagem estética fatores sociais, impulsiona a liberdade humana para imaginar, inferir, atribuir sentidos e significar a própria vida.

Assim, a arte literária parece caminho possível para atiçar, por meio da sensibilização, a empatia, a tolerância, o bem-estar mental e físico – valores indispensáveis para o exercício da cidadania. Dito isso, considerando as ideias citadas e no intuito de refletir acerca dessa relação arte literária e formação cidadã, seguem duas citações de Antonio Candido no livro “Direito à literatura e outros ensaios” (2005):

“[…] a literatura corresponde a uma necessidade universal que deve ser satisfeita sob pena de mutilar a personalidade, porque pelo fato de dar forma aos sentimentos e à visão do mundo ela nos organiza, nos liberta do caos e, portanto, nos humaniza. Negar a fruição da literatura é mutilar a nossa humanidade.”

Ademais,

“[…] Uma sociedade justa pressupõe o respeito dos direitos humanos, e a fruição da arte e da literatura em todas as modalidades e em todos os níveis é um direito inalienável”.

 

Dito isso, cidadã/o, vamos ler literatura?

 

 

Jennifer Trajano (1996) é paraibana, natural de João Pessoa – PB, professora de língua portuguesa, revisora textual, mestra em letras pela UFPB e autora dos livros “Latíbulos” (Escaleras, 2019), “Diga aos brancos que não vou” (Urutau, 2021) e “Pequenas Ampulhetas” (Autopublicação, 2023). Já publicou em algumas antologias poéticas nacionais e internacionais, a exemplo de “CULT Antologia Poética #3: poemas para fazer o luto desse tempo” (REVISTA CULT, 2020).