Irapuan Sobral: a cidade da minha época infantil, que me inspirou o texto

O vento soprava avisos de tempo, anunciando um meio-dia cansado. Traduzia-o o sol com aqueles raios atirados contra tudo que opusesse a resistência da sombra. Mesmo assim, nem toda sombra era plasticamente íntegra. A aliança com o vento, que poderia ajudar tangendo o calor, entortava as pontas dos desenhos.

Em Jatobá, a essa hora, nem à igreja se oferece repouso de misericórdia. A bem dizer: a igreja, da calçada da casa grande que a confronta, com aquela cor amarelo-sofrida, parece um pino do sol no chão fervendo.
A gente fecha os olhos, deixando um tênue fio de observação para não ferver como a tela.

Subindo a rua, até o cinema, um caudaloso rio de pedras busca à montante entregar as súplicas ao padroeiro.
Com mais alguns passos, e uma desidratação suada, que o vento mal espera pela transpiração para beber, se chega no Coreto.

Ana Palpita mora ali. Se o sol é Hélio, Ana é o feminino de sol. Ela não se incomoda com o calor, nem com aquelas pitadas de raios que o vento aplica sobre a pele dos viventes.
Um de nós sugeriu que Ana nunca morreu; havia se desintegrado em um meio-dia como aquele, e que era possível vê-la, na praça, saindo para a igreja, num solstício de verão que ocorresse àquela hora, mas em imagem pós-impressionista.

A forma de personalizá-la, extraindo-a da tela da seca, era pondo um copo de alumínio, com um pouco daquela fina areia branca, em cima do Coreto, até à primeira lua cheia completa.
Não sei quem aviou a receita, mas era possível tateá-la naquele vento quente.