Hoje me peguei pensando em enviar um e-mail para minha amiga Edith com o seguinte assunto: “Pare de me indicar livros bons!”

Imaginei os segundos que o e-mail levaria para aportar em sua caixa de entrada, imaginei a gargalhada que ela daria ao ler aquela ordem peremptória.

Edith, professora de filosofia, é uma amiga com quem converso todos os dias, sempre por e-mail, e, quando a sacola está cheia de vontade de falar, usamos o telefone. Falamos sobre tudo, mas o tema principal das nossas conversas são os livros.

Nossa amizade começou em 1997, quando compramos nosso primeiro computador doméstico e, por conexões discadas, iniciamos essa conversa longa, essa carta permanente onde os livros vão se avolumando, ganhando espaço, mantendo entre nós o prazer de tocar no conhecimento, experimentar as perturbações e as ousadias dos cientistas, sentir o prazer de vibrar com a boa literatura, garimpar por antiguidades que nos surpreendem por sua atualidade.

Minha amiga Edith não para de me indicar livros bons. E assim, por culpa dela, minha mesa de leituras é um caos, uma desordem sem precedentes, com livros abertos, outros apenas entreabertos, outros ainda fechados, enquanto meu espírito de leitora freme de curiosidade.

Querem ver? Semana passada, Edith me indicou três livros bons: O Ponto do Caos, de Ervin Lazlo, “Quando Deixamos de Entender o Mundo”, de Benjamin Labatut, e “Oppenheimer – O Triunfo e a Tragédia do Prometeu Americano”, by Kai Bird e Martin J. Sherwin.

Não satisfeita, ontem e hoje, veio com mais dois livros bons: “A máquina da vergonha – quem ganha na nova era da humilhação” de Catherine Helen O’Neil, e “A Ciência tem Todas as Respostas”, de Sabine Hossenfelder.

Nas semanas anteriores já tinha me indicado a outra obra fascinante de Benjamin Labatut, “O Maníaco”, que nos faz pensar sobre ciência, ética, sobre o futuro e a permanência da vida no planeta Terra.

Em nossas cartas, quando estamos meio sem nada para fazer, dizemos que estamos vivendo um tempo plano. Essa é uma das invenções de Edith. Em verdade, naquela cabeça, o tempo nunca será plano. Feito uma antena, um radar, Edith parece que sente o cheiro dos livros bons antes mesmo que eles cheguem às livrarias.

Os livros que ela me indica desorganizam esse tempo/espaço tridimensional, me envergam, me desapossam desse mundo onde estamos plantados, com nossos hábitos, nossas vontades, nosso modo de vida e consumo.

Os livros de Edith me levam para um lugar bem longe daqui, mas eu não saberia viver com o que eles me causam. Nessa minha mesa de leituras, nessa confusão de livros abertos, livros entreabertos, livros fechados, nessa minha mesa onde o laptop exibe um novo e-mail de Edith, sinto um mundo que agoniza em dilemas, angústias, descobertas, belezas, alegrias, reflexões, pensamento grandioso por entre páginas e páginas que quero ler, feliz por estar nesse tempo, nessa vida, nesse presente onde se escreve tanto.

E já agora, penso que não gostei muito do título dessa crônica. Talvez eu pudesse dar-lhe o título de “A Desordem do Tempo Plano”, mas não, deixemos assim, uma crônica com um título ruim, mas que faz um brinde aos livros e à amizade de Edith.