Na antiga sede da Funasa em João Pessoa, prefeito entrega bem elaborado projeto com pedido de financiamento para rede de esgotos na pequena cidade que governa no Sertão paraibano. Encaminhada à direção nacional da Fundação, a proposta é rapidamente aprovada e a verba solicitada, previamente empenhada. Mas aí… Um mês, dois, três meses e nada do dinheiro cair na conta da Prefeitura.
Saneamento básico era sonho antigo do prefeito e de seus concidadãos. Precisava de R$ 2 milhões para resolver. “Tem que usar o prestígio do senador, Prefeito”, aconselhou o secretário de Infra do município. Novo no ofício, avesso a intermediações, o alcaide não queria ir pelo caminho sugerido nem entendia a demora. Afinal, seu projeto passara com nota alta na avaliação técnica do próprio financiador.
“Pra que recorrer ao senador (?), se tudo foi a gente que fez por aqui mesmo”, rebateu o prefeito, lembrando que o esgotamento sanitário não tinha que render dinheiro nem voto pra seu ninguém, apenas saúde para a população local. Dizia coisas assim no exato momento em que sua chefe de Gabinete entrou na sala. “O senhor atende Fulano, assessor do deputado Sicrano? Tá na linha…”
“Passe”, autorizou o prefeito, já tirando o fone do gancho e fazendo sinal para os dois auxiliares saírem da sala. Queria privacidade. Pressentia o objetivo daquela chamada. Encerrada a conversa ao telefone, chamou o assessor de volta. “O filho da puta do Sicrano tá querendo 25% e já tem uma construtora pra fazer o serviço e pagar a propina dele”, disse ao assessor, complementando:
– Deixei claro que o projeto já estava aprovado e o dinheiro empenhado, pronto para ser liberado a qualquer momento sem ajuda nem influência de ninguém, mas ele me falou na maior cara de pau que o deputado pode até não ter ajudado na aprovação, mas tem força para vetar a liberação. Fiquei sem saída. Acertei pra falar pessoalmente com Sicrano. Ele vai estar na Paraíba semana que vem.
Quatro dias depois, o prefeito foi recebido no escritório do parlamentar na capital do Estado. Fechou acordo com o pilantra federal, então reconhecidamente prestigiado por ministérios com fartura de recursos. “Quanto?”, perguntou o assessor, tão logo o chefe retornou à cidade. “Sete por cento”. Só? “Só, mas ele não abre mão da firma – que é dele – pra fazer o serviço. Na licitação, vamos ter que dar um jeito… E pensar que a gente corre o risco de ter esse canalha como governador”, lamentou o prefeito.
Rubens Nóbrega
Escritor e Jornalista desde 1974. Integrante do Observatório Paraibano de Jornalismo.