A imagem que acompanha este texto é um retrato artístico abstrato de um rosto feminino com expressão serena e onírica. Olhos entreabertos, lábios levemente abertos e feições que se dissolvem em pinceladas ondulantes e coloridas – como se fossem fios de vento, pensamento ou memória. A composição, marcada por tons suaves de azul, rosa, verde e vermelho, cria um efeito visual hipnótico, evocando o “desver” sugerido por Manuel de Barros: um convite ao silêncio e à introspecção.
A imagem que acompanha este texto é um retrato artístico abstrato de um rosto feminino com expressão serena e onírica. Olhos entreabertos, lábios levemente abertos e feições que se dissolvem em pinceladas ondulantes e coloridas – como se fossem fios de vento, pensamento ou memória. A composição, marcada por tons suaves de azul, rosa, verde e vermelho, cria um efeito visual hipnótico, evocando o “desver” sugerido por Manuel de Barros: um convite ao silêncio e à introspecção.
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Façam silêncio. Desliguem a tv. Desabilitem as notificações. Fechem os olhos. Vamos praticar um pouco do “desver”, como nos sugeriu Manuel de Barros. Vamos tentar entender o que está acontecendo com nosso país, com as nossas vidas.

Suspendam os memes, as colunas de opinião, os artigos de economia. Limpem as vistas desse ruído semiótico. Guardem a pulsão e o desejo de saberem o que está acontecendo. Abram o olhar para o vazio, os vãos, as frestas e entendam logo que ver não é a mesma coisa que olhar.

Digo isto porque parece que estamos vendo esse espetáculo dos últimos dias como se fosse um filme de horror, com duas versões principais e uma espécie de balbúrdia semiótica em torno, uma proliferação de signos tão vasta que pode enlouquecer até a inteligência artificial por overdose de dados.

Sim, a soberania do Brasil está sob ataque maciço dos mesmos personagens cujo projeto político é destruir, eliminar, abrir, perfurar, forçar, achacar, chantagear, uma avalanche tão vasta de verbos outros, verbos duros, exatos, higienizados de todo e qualquer resquício de respeito, de dignidade, de coragem.

A covardia é apanágio dos canalhas, dos cínicos, aqueles para quem a psicanálise clássica rejeitou tratamento, porque estão completamente fora da realidade do outro, ou por outra, desejam um mundo feliz, onde somente eles possam estar.

De que modo estamos vendo esses cínicos, esses canalhas, esses covardes? E será que nossa vista alcança a súcia dos oportunistas, das muitas outras réplicas desses  cínicos, covardes e canalhas?

Será que já nos demos conta de que estamos fortalecendo a trama pérfida forjada por eles? Na saga deles, o grande senhor da águia é o herói. O nosso país é o inimigo, o caçador de bruxas, perseguindo o homem bom, o trolador querido, que faz política como quem conta piadas.

O que é a verdade para esses cínicos? Ä verdade é o que eu disser que é verdade”, brada cada um deles, enquanto seus asseclas principais articulam a derrocada da governança brasileira e cavam uma espécie de dobra do espaço-tempo para regressarem a três anos antes, quando praticavam o seu desgoverno nefasto.

O que é a realidade para esses covardes? “A realidade é o que eu quiser que seja real, o que couber nas minhas mãos, na minha sanha vigorosa de destruição”, brada cada um deles, enquanto engrossa e replica  suas mentiras.

Sim, paremos de ver tudo isso como um filme de horror, fabricado na indústria multinacional de mentiras, ignomínias, fortuna amealhada por aqueles que mandam no mundo, para explorar, dominar, submeter, em séculos e séculos amém.

Olhemos em silêncio para esses covardes. Das suas falas rasas, cheias de um falso vigor, escutemos somente o tom das suas vozes, as suas pausas curtas, a sua respiração ofegante, o ruído das suas línguas roçando seus palatos secos.

Façamos pausa para um café, deixemos repousar na nossa penseira pessoal, ao modo da penseira do professor Dumbledore, na saga de Harry Poter, a essência do que foi extraído desse filme de horror, ou por outra, desse nosso olhar, dessa nossa escuta silenciosa.

Que papel queremos nessa  tragédia? O que esperamos desse nosso olhar silencioso? Eu por mim, não quero ser apenas plateia. Quero recuperar a utopia de um pensamento próprio sobre tudo isso. Com meus olhos que só podem “desver”, quero olhar bem para esses cínicos, esses covardes.

Quero ver quanto de humanidade, de alteridade eles ainda possuem ou não possuem. Quero olhar para o tamanho da sua desonestidade, para o gozo com as mentiras que eles engendram.

Quero ficar quieta, em silêncio, apenas olhando. E vocês?

Sim, eu sei. Esse meu método é tão vago, tão cheio de nada, tão próximo de uma quase filosofia… Esse meu texto é tão curto, eu sei, mas é somente o que posso dizer agora.