“O PL 399/2015 repousa num tipo de purgatório desde a sua aprovação, conforme o rito em caráter conclusivo. Trata-se de um exemplo de mais um zumbi parlamentar, um morto-vivo, aprovado, mas desaprovado pela supremacia da percepção punitivista em torno do mito da cannabis (e sua “malevolência”) contra as evidências, contra a ciência e inovação e também contrariamente ao efetivo cumprimento da política de desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil, conforme artigos 218 a 219B da Constituição Federal).”

  (Fabiana de Menezes Soares –  professora doutora e mestre em Direito da UFMG e coordenadora do Observatório para qualidade da Lei e do Legislab)

Conflito entre Legislativo e Judiciário na legalização da Cannabis; um impasse de seis Anos.

O embate entre Legislativo e Judiciário em torno da legalização do uso terapêutico da cannabis no Brasil tem sido um processo prolongado e complexo. Tudo começou com o PL nº 399/2015, proposto por Fábio Mitidieri, que buscava modificar a Lei nº 11.343/2006 para viabilizar a comercialização de medicamentos à base de cannabis. Após seis anos de tramitação e diversas audiências públicas, o projeto foi aprovado em uma Comissão Especial, mas desde então permanece estagnado, refletindo a resistência à mudança e a prevalência de uma visão punitivista em relação à cannabis.

Enquanto isso, iniciativas estaduais e municipais têm buscado garantir o acesso à cannabis terapêutica pelo SUS, mas a falta de uma legislação clara cria incertezas quanto ao amplo acesso à substância. A atuação da Anvisa tem sido limitada, permitindo apenas a importação da cannabis, sem abordar questões como o cultivo e o acesso econômico ao medicamento.

O Judiciário, por sua vez, tem sido provocado a agir diante da inação legislativa, mas suas intervenções não têm sido suficientes para resolver o impasse. Recentemente, a suspensão de ações que discutem o cultivo da cannabis para fins medicinais pelo STJ gerou controvérsia, evidenciando a necessidade de uma abordagem mais abrangente por parte do Estado.

A proposta de inclusão de um novo inciso na Constituição pela PEC 45/2023 levanta preocupações quanto à criminalização da posse de substâncias psicoativas, o que poderia dificultar ainda mais o acesso à cannabis terapêutica. Apesar de reconhecer a importância do direito à saúde, essa abordagem pode criar um ciclo infinito de regulamentações e gerar mais incertezas quanto ao acesso ao medicamento.

Diante desse cenário, o Legislativo mostra-se passivo e omisso, enquanto o Judiciário acaba assumindo um papel central na resolução do conflito. No entanto, é fundamental que o Legislativo assuma sua responsabilidade e promova uma legislação clara e abrangente que garanta o acesso seguro e econômico à cannabis terapêutica.



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